EDUCADOR: LEITOR-MEDIADOR NO PROCESSO DE INICIAÇÃO À LEITURA[1].



Por Rosilene da Conceição Cordeiro[2]

enelisorcordeiro@yahoo.com.br

“[...] O menino quer um burrinho para passear [...] que saiba inventar histórias bonitas, com pessoas e bichos e com barquinhos no mar. E os dois sairão pelo mundo que é como um jardim, apenas mais largo e talvez mais comprido e que não tenha fim [...]”

(Cecília Meireles- fragmento do poema O menino azul)


Mediação e aprendizagem: primeiras palavras

O burrinho que o menino azul de Cecília Meireles procura, talvez caiba poeticamente no exemplo sobre o que penso como mediação. Palavra vinculada ao verbo mediar, metaforicamente me remete a refletir sobre uma ponte que liga dois lados distintos pela qual alguém atravessa, pela qual precisa passar, algumas vezes, para descobrir o outro lado do lugar onde se encontra. Mediar conhecimentos poderia, assim, significar promover o encontro daquele que aprende com a outra “margem” daquilo que ele já tem por “verdade” descoberta, reconhecida e confortada enquanto informação dentro dele. Um burrinho fantasiado pela imaginação criativa de uma criança ou um professor criativo e cativante na realidade, ambos podem “conduzir” a mesma (os meninos e as meninas a que tem acesso) a passear faceiros e desbravadores nesse mundo “que não tem fim” chamado literatura.

Metáforas à parte e precisando assentar o presente trabalho em argumentações já testadas e, portanto, aceitas cientificamente, não poderíamos tomar o conceito de mediação sem identificá-lo dentre uma das categorias que encontrou em Vygotsky[3], um fiel interlocutor, tendo nesta palavra um conceito central para a compreensão acerca do desenvolvimento da aprendizagem na criança.

Para o estudioso do desenvolvimento intelectual infantil, no que se refere à aprendizagem, a mediação consiste no processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação, o que poderia ser representado por uma ação na qual a relação deixa de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento, o que pode ser entendido segundo Kohl (1993, p. 35) como a “capacidade de lidar com representações que substituem o próprio real, possibilitando ao ser humano a capacidade de liberta-se do espaço e do tempo presentes, fazendo relações mentais na ausência das próprias coisas, imaginar, fazer planos e ter intenções”.

De acordo com a autora, Vygotsky trabalha com a concepção de que a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas fundamentalmente, uma relação mediada. Partindo dessa premissa, a aprendizagem ocorre por meio de aspectos que uma vez organizados entre si, oportunizam um “descobrir” a partir de recursos que aproximem a criança de uma dada realidade que ela desconhece, mas que passa a conhecer e, destarte, nessa dada circunstância, é capaz de estabelecer relação com ela.

Dentre os tantos outros conceitos amplamente difundidos em seus trabalhos está o de aprendizagem intimamente ligada à interação. De acordo com Basso (s.d), para Vygotsky, todo e qualquer processo de aprendizagem é ensino-aprendizagem, incluindo aquele que aprende, aquele que ensina e a relação entre eles e, assim, a aprendizagem tem um papel fundamental para o desenvolvimento do saber, do conhecimento, que por meio da mediação, aos poucos, vai fazendo parte da vida da criança.

Em se tratando do trabalho com a leitura e a literatura na escola, não teremos como conversar sem chamar o conceito para a centralidade deste diálogo, uma vez que o educador representa (ou pelo menos deve representar) o canal, o meio, essa ponte pela qual as descobertas sobre o mundo até então desconhecido para a criança, torne-se conhecido, presentificado e vislumbrado com encantamento reclamando que ela mesma o desvende, que alcance a fundura do interesse infantil através de sua curiosidade interrogativa, aquela que o mobiliza a todo instante a buscar o inusitado.

A palavra literária, no presente contexto de análise, assume contornos de personagem principal, figurando como fiel escudeira da criança. É por meio dela, da palavra como código de acesso que o mundo das letras será conhecido, organizado e reconstruído segundo seus interesses e necessidades, aspectos que vão, aos poucos, se oferecendo a ela como forma de ampliar seu repertório lingüístico oral, imagético e como registro escrito, futuramente, o que pode ser conferido na afirmação de Chiappini (2001, p. 230)

A literatura é um discurso carregado de vivência íntima e profunda que suscita no leitor o desejo de prolongar ou renovar as experiências que veicula. Constitui um elo privilegiado entre o homem e o mundo, pois sugere as fantasias, desencadeia novas emoções, ativa o nosso intelecto, trazendo e produzindo conhecimento. Ela é criação, uma espécie de irrealidade que adensa a realidade, tornando-nos observadores de nós mesmos.

Da mesma forma que é verdade que uma das funções da escola é formar o escritor crítico e que ao educador cabe promover em larga escala essa dada competência por meio do desenvolvimento de habilidades específicas no cotidiano de sua prática docente, é fato também, que essa mediação só será possível quando existir em quem media, a relação de acolhimento e procura desta aprendizagem para si, antes de qualquer outra ação, por mais bem intencionada que esta pareça.

Como se pode intermediar aquilo que não se deseja primeiramente para si mesmo, um conhecimento que ainda não alcançou o próprio interesse do educador? Relação que não foi estabelecida satisfatoriamente entre educador e leitura prazerosa, que não gerou íntima e irreversível aproximação com ela ao ponto de incluí-la no seu próprio “cardápio do dia” como delicioso alimento que uma vez experimentado, degustado, o nutre, alimenta-o; como pode ser recomendada como iguaria desejosa do paladar de seus educandos diariamente?

Mediação só é feita por quem “comeu e bebeu” da fonte infindável de algo que se apetece distribuir na forma de conhecimentos produzidos por meio de saberes compartilhados, porque se torna algo tão grande e especial que não cabe apenas em quem a descobre, almeja encontrar regaço no outro que o recebe e no qual se completa como obra. Por que o livro só se completa como obra artística e estética que é, no leitor, alcançando sua estimosa função social de encontro consigo e com o outro como carência relacionada ao humano que há em nós, algo que buscamos para encontrar a nós mesmos como Gebara (2002, p. 11) tão bem enfatiza:

Lemos porque vivemos rodeados por signos, símbolos, ícones que compulsoriamente exigem a tarefa infindável da busca do sentido. Lemos também porque vamos ao encalço do sentido dado pelo outro, criado por ele porque desejamos alcançá-lo de alguma forma. Lemos, ainda, porque nos procuramos.

A palavra partilhada enquanto signo[4], variável e flexível, marcada pela mobilidade que lhe confere o contexto, revela a importância de conhecê-la para que seu uso seja possível na dimensão da criticidade que se objetiva desenvolver na criança, sem perder de vista o seu caráter lúdico, o que ocorre, substancialmente, por meio da leitura, uma vez que

O ato de ler é um processo abrangente e complexo; é um processo de compreensão, intelecção do mundo que envolve uma característica essencial e singular ao homem: a sua capacidade simbólica e de interação com o outro pela mediação da palavra (CHIAPPINI, 2001, p. 17).

Uma preocupação recorrente e sempre atual de docentes, estudiosos e pesquisadores de área tem se dado no campo da concepção de leitura que precisa ser considerada não apenas como um mero “ajuntamento” de sinais gráficos, organizados harmonicamente entre si e passíveis de algum sentido lógico formal, mas como um decodificador da palavra que está materializada na vida, que se inscreve no tempo e no espaço desse contexto em que educador e educando se encontram e em que a aprendizagem dos sujeitos educativos se dá, configurando-os como protagonistas de uma relação dialógica em permanente processo de aquisição e produção de conhecimento recíproco em torno da linguagem oral.

E, partindo dessas considerações, observamos a grandeza do papel do formador de leitores, como cada educador deve se reconhecer e identificar para essas diferentes crianças que tem diante de si. Diante dele está o desafio de estabelecer a leitura em sua sala de aula e para além dela, como exercício de cidadania, como direito adquirido e usufruído com qualidade, privilegiando suas crianças, ora chamadas “educandos”, com um repertório de temas e estilos infinitamente variados que disponibilizem com alegria, a sua incansável busca no sentido de trocar impressões e aprendizagens sobre inúmeras questões que surjam, sendo capaz de “ultrapassar os limites pontuais de um texto e incorporá-lo reflexivamente ao seu universo de conhecimento de forma a levá-lo [s] a melhor compreender seu mundo e o seu semelhante” (CHIAPPINI, 2001, p. 22. grifos nossos).

E um problema recorrente se mostra neste aspecto uma vez que, segundo Ferreiro (2003, p. 48)

O ponto delicado de qualquer processo de mudança qualitativa é a capacitação dos professores. Isto se desdobra em vários subproblemas. Em primeiro lugar está a situação dos professores como usuários da língua escrita. Há poucos dados sistemáticos a respeito, porém os poucos dados disponíveis parecem apontar para a mesma direção: os professores lêem pouco, escrevem menos e estão mal alfabetizados para abordar a diversidade de estilos da língua escrita.

Para Paiva (2005) esse desafio precisa ser enfrentado, no entanto o educador precisa munir-se de recursos, meios, instrumentos, mas, sobretudo, alargar sua capacidade de acolher a leitura em si, querê-la, desejá-la como necessidade sua, primeiramente e só depois, como arcabouço que o qualifique profissionalmente, porque “É muito difícil que alguém, que não lê mais do que o absolutamente indispensável, possa transmitir prazer pela leitura” (PAIVA, 2005, p.48) e em face desta postura outra problemática emerge determinante:

A convivência com textos em ambiente escolar passa a ser o centro e várias questões: como os professores tratam esse material; o que ele representa para os docentes; o quanto ele é utilizado; a possibilidade de circulação desse texto; de que modo ocorre o contato individual com ele. Todos esses aspectos estão influenciando a constituição de uma imagem do que seja a leitura e sua função neste ambiente. As crianças quando são iniciadas nessa atividade, aprendem, num primeiro momento, como ela se desenvolve em ambiente escolar. Infelizmente, para muitas, só neste local. (GEBARA, 2002, p. 22)

Deseja-se, deste modo, que os educadores possam ir assumindo uma nova postura cultural frente aos estigmas da leitura obrigatória e sistemática difundida pela educação tradicional formal, educação a qual foram submetidos, em anos de sua formação discente, aquela desprovida de sentido e significação pessoal que alguns ainda teimam representar como ideário, mas que, efetivamente, não reflete os anseios educativos deste século.

E, se por acaso não forem devidamente estimulados a descobrir em situações de interação, junto com seus alunos, o que não tiveram condições de descobrir quando eles mesmos eram alunos, muito provavelmente falharão na tarefa de promover o encantamento pela leitura por meio do prazer; e talvez a escola como ambiente onde muitas crianças têm o primeiro e- em muitos casos- muito provavelmente o único espaço de contato privilegiado com a linguagem literária escrita e oralizada, por meio desta conduta equivocada, continuará sendo elevada à grande vilã de um enredo de aversão à prática da leitura recreativa, lúdica e prazerosa por elas onde quer que estas se encontrem.

Leitura e literatura na escola: limites e possibilidades

A leitura de textos não pode existir na escola apenas por meio do livro didático. Para Gebara (2002, p. 26) “Um primeiro passo para todos nós leitores [...] é enfrentarmos os textos literários, visto que eles se revelam como objetos privilegiados para a leitura estética” primordial para que a leitura como prazer e desejo seja evidenciada como o previsto em nossos planejamentos e projetos em torno do acesso das crianças à literatura infantil, como um brinquedo incluído por elas no seu jogo de faz-de-conta. O que a autora argumenta complementando com solidez:

A leitura estética quando desenvolvida pela criança, também pode ser entendida como uma ação lúdica determinada pela estrutura do material, o texto literário [...]. Este seria o brinquedo que por ser utilizado de diversas maneiras, que pode ou não ser elaborado tendo em vista a brincadeira. É possível ver uma criança brincando com uma panela como se fosse tambor. É possível, portanto, de forma analógica, encontrar exemplos de textos que não foram feitos para crianças, mas que são objetos de suas brincadeiras (GEBARA, 2002, p. 31).

Podemos verificar, segundo o prisma dado por essa concepção, que a leitura estética da poesia e dos demais gêneros literários (conto, prosa, fábula, entre outros) é possível para todas as idades, principalmente para as crianças, pois nelas o impulso lúdico está presente como modo de exploração do real. “[...] Assim como o poeta, elas procuram as possibilidades do dizer. Mas como descobrir esse encantamento, essa vontade de ‘dizer’ por meio do que se lê e do que se ouve se as crianças não tiverem ao lado quem as instigue, as provoque, as convide [...]” (idem, p. 32) a brincar com palavras como se brinca com bola, papagaio, pião? Parafraseando José Paulo Paes (1996) em seu poema Convite.

O educador repleto de acervo textual e tocado pela compreensão da nobreza de seu papel social não o guarda para si, alimenta-se de compartilhá-lo como polinizador de idéias, contador de histórias que povoam seu imaginário colocando-se disponível, inclusive, a retroalimentar-se profissionalmente desse fazer como capacitação numa permuta afetiva com a criança que, de repente, ensina também na forma como esta devolve a ele a criticidade daquilo que ele está realizando, experiência que por certo o ajude a pôr em crise as concepções anteriores exigindo dele, um novo pensar e um novo comportamento frente a esses dilemas que se apresentam a ele, como tão bem salienta Ferreiro (2003, p. 51).

O que sabemos é que os professores que se atrevem a dar a palavra às crianças e a escutá-las descobrem rapidamente que seu próprio trabalho se torna mais interessante (e inclusive mais divertido), embora seja mais difícil porque os obriga continuamente a pensar.

O educador entendido como leitor-mediador é o interlocutor privilegiado do mundo das letras apresentando-o às crianças, por isso, antes que todos necessita encharcar-se de matéria-prima textual para, então, conseguir realizar aquele que por certo é um de seus grandes intentos: promover o acesso aos livros, difundir o gosto, o prazer e alegria de ler por meio do seu gosto, do seu próprio prazer e da sua alegria em acolher e leitura como algo bom e desejado, para então praticar a mediação por meio das palavras que aos poucos vai dividindo com suas crianças como pedaços-inteiros de alegria, expressões que reverberam no seu corpo que conta, palavras e vozes que o habitam que extrapolam a fala e traduzem novos códigos corporais e interpretativos exalando possibilidades criativas sem conta, uma vez que,

Se alguém lê um poema para a criança, a melodia, o tom, a forma como se alternam tônicas e átonas, a presença maciça ou quase imperceptível da pontuação, são percebidos como forma de expressão corporal, pois envolvem a voz e os gestos que a acompanham. Se a própria criança está lendo, será a vez de sua voz imprimir sensações que podem ou não se refletir na organização total do que foi lido. Porque “figuras” como a rima, a aliteração e a paranomásia não tem outro alvo senão remotivar, de modos diversos, o som de que é feito o signo (BOSI, 1983 apud GEBARA, 2002, p. 37).

Diante da ação docente, portanto, um desafio bastante pessoal e intransferível: tornar a leitura algo bom e desejado para si, em suas práticas e discursos para, só assim, então, disponibilizá-la com o merecimento que lhe é devido, na escola e, sobretudo, na vida na qual ela ergue-se como possibilidade de ligar mundos, tornando conhecidos personagens, enredos e cenários que habitam a ficção e a realidade a sua volta, pois

O professor que trabalha com literatura infantil deve ter em mente o seu papel de estimulador, orientador e mediador entre o aluno (que é um ser em formação) e a literatura que será o meio de acesso para o conhecimento e o mundo da cultura, que caracteriza a sociedade em que vive.( CANTARELLI, 2006, p. 3)

E ao educador de crianças em fase de iniciação à leitura, salientamos que é preciso cultivar o desejo de perseverar em sua formação para além da rotina que o condiciona muitas vezes, a fazer o uso mecânico da palavra, frio, sem comprometimento com a afetividade e a transformação social, uma vez que o contato com a literatura possibilita uma ação política muito importante para os processos educativos como um todo, uma vez que, “Ler um texto literário significa entrar em novas relações, sofrer um processo de transformação. [...] nesse novo discurso, vozes remotas entram em sintonia, dialogam entre si, passado e presente se juntam no tecido da experiência.” (CHIAPPINI, 2001, p. 23). Contudo, é preciso abertura humana para que essas passagens, conexões, relações afetivas se apresentem e consolidem, tarefa que depende se cada educador ou educadora desejar experimentar vendo sua prática atingir outros desdobramentos bem mais satisfatórios do que imagina, sem perder de vista seus fins didáticos, visto que

A literatura integra diversos prazeres: o da criação, o da ação, o do conhecimento, o do bem-estar interior, o do lazer- que se condensam na fruição; a escola pode ser séria sem ser sisuda e enfadonha. Seguramente um bom leitor de textos literários, em especial de poesia, essa espécie de “bastardinha” na escola, será um excelente leitor de textos sérios: os informativos, os científicos, etc. (CHIAPPINI, 2001, p. 27).

O enfrentamento dessas causas que tanto tencionam a compreensão e valorização da importância do trabalho com a literatura infantil na escola, especialmente no âmbito da Educação Infantil, prolongando-se de forma efetiva até as séries iniciais do Ensino Fundamental, se configura como algo carente de alternativas e amplamente desafiador para o educador contemporâneo, mas plenamente possível de ser alterado, caso ele aspire este embate e prepare-se adequadamente para tal, a fim de que prevaleça sempre a sua capacidade criadora, reflexiva e transformadora inerentes a sua condição de agente de formação que é. A literatura, entendida sob essa lente, figura como instauradora de um mundo construído pela palavra como expõe Chiappini uma vez que “Ela atua no intervalo que se estabelece entre o real objetivo e o eu. Espécie de mediadora privilegiada, ela nos transmite uma experiência estética e uma dimensão libertadora, que co-responde aos nossos anseios”. ( 2001, p. 25)

Com base em tais reflexões, manifestamos o que entendemos por possibilidades em torno da importância do trabalho docente com a literatura infantil na escola, no intuito de dar um novo fôlego às discussões e práticas acerca da ação do educador como propulsora de descobertas e ênfase de estímulo à leitura como ato consciente, importante e tanto almejado pelas crianças. Estas ao terem a chance de percebê-la com o sabor do conteúdo que o texto literário carrega e como potencialidade lúdica, recreativa e, por conseguinte, das inúmeras aprendizagens que proporciona, desejam conquistá-la com alegria, lançam-se a caminhar sempre em busca de novos sentidos, querem praticá-la não como hábito, mas como brinquedo e brincadeira, pela novidade que se constitui “[...] no aspecto mais universal do ser. [...] A nossa própria existência é uma constante busca do novo, em cujo encontro vamos desdobrando, ampliando e enriquecendo pessoalmente a nossa humanidade.” (LYRA apud GEBARA, 2002, p. 38).

Humanidade esta que se assume no grande desafio que a vida social nos impõe: encontrar o humano nas pessoas, nos processos e, porque não dizer, a humanização da palavra, o lugar da nossa própria palavra no mundo da linguagem no qual ela se instaura como instrumento de libertação pessoal e transformação social pela fundura que ela comporta tão bem expressa por Hollanda na música “Uma palavra”, ao defini-la como

Palavra viva, palavra com temperatura, palavra que se produz, Muda. Feita de luz mais que de vento, palavra. Palavra dócil, palavra d’água pra qualquer moldura. Que se acomoda em balde, em verso em mágoa. Palavra boa. Não de fazer literatura, palavra. Mas de habitar, fundo. O coração do pensamento, palavra.

Palavra e criança merecem, assim, encontrar-se naquilo que se constitui sua estreiteza primeva. Ambas passíveis de largas possibilidades e desdobramentos, juntas, sobretudo. Na escola, por meio do educador leitor-mediador, um compromisso se estabelece: aproximá-las relacionando-as de tal modo que se tornem parceiras inseparáveis, assegurando à criança o usufruto pleno dessa relação por meio do prazer e da alegria que o encontro com a leitura oportuniza. A literatura, aqui, encontra um sentido privilegiado de ser, pois “[...] transforma a palavra comum através de combinações, dá-lhe um sopro mágico capaz de fazê-la resistir às mudanças dos tempos. O discurso artístico busca o frescor e o perfume do novo: cria palavras ou, paradoxalmente, volta ao passado.”( CHIAPPINI, 2001, p. 24)

Um menino e seu burrinho muito provavelmente possam encontrar-se nela, cavalgar juntos desbravando o mundo azul pelos vastos caminhos da leitura pelo campo aberto da aprendizagem como “[...] um jardim, apenas mais largo e talvez mais comprido e que não tenha fim”.

REFERÊNCIAS

ALBUQUERQUE, E. B. C. de. Alfabetização e Letramento: O que são? Como se relacionam? Como alfabetizar letrando? Revista Construir Notícias, Belo Horizonte. Nº 37- Ano 07- Novembro/Dezembro 2007. pp. 05 a 13.

BORDINI, M. da G.; AGUIAR, V. T. de. Literatura: A formação do leitor- alternativas metodológicas. Série Novas Perspectivas 27, 2ª ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993.

BASSO, Cíntia Maria. Piaget, Wallon e Vygotsky. Algumas reflexões sobre o ensino mediado por computadores. [s.d]. Artigo disoinível em http://www.ufsm.br/lec/02_00/Cintia-L&C4.htm, acessado em 10/10/2011.

CANTARELLI, Ana Paula. Literatura Infantil: Instrumento educacional. UFMS, 2006. Disponível em www.unifra.br/eventos/.../2006/.../LITERATURA%20INFANTILpdf, acessado em 28/09/2011.

CHIAPPINI, L. Aprender e ensinar com textos didáticos e paradidáticos. São Paulo: Cortez, 2001.

DINIZ, Mariana Rosalina de Faria Vasconcelos. Era uma vez... é hora de resgatar o prazer. (in) Núcleo Marista de Educação à Distância. Texto sugerido no Curso Infâncias: Leitura e Literatura Infantil: Fantasias, Narrativas e Histórias. Agosto, 2011. Disponível em http://ead.marista.edu.br/, acessado em 19/08/2011.

FERREIRO, E. Com todas as letras. 11ª ed., São Paulo: Cortez, 2003.

GEBARA, A. E. L. A poesia na escola: leitura e análise de poesia para crianças. São Paulo: Cortez, 2002.

KOHL, M. de O. Vygotsky - Aprendizagem e desenvolvimento um processo histórico. Série Pensamento e ação no magistério. São Paulo: Scipione, 1993.

LAJOLO, M. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. Série Educação em Ação. São Paulo: Ática, 1993.

LYRA, P. Conceito de Poesia. Série Princípios. São Paulo: Ática, 1986.

RODARI, G. Gramática da Fantasia. Coleção Novas Buscas em Educação 11. São Paulo: Summus, 1982.

MEIRELES, C. O menino azul. São Paulo: Global, 2004.

PAIVA, A. A leitura literária no processo de alfabetização: a mediação do professor. In: Alfabetização e Letramento na infância. Boletim 09, junho de 2005, pp. 42-49.



[1] Texto produzido como atividade final no âmbito do Curso de Infâncias- Leitura e Literatura Infantil: Fantasias Narrativas e Histórias, promovido pelo Núcleo Marista de Educação à Distância- NEAD, realizado em 2011, sob a tutoria da Profa. Msc. Mariana Vasconcelos.

[2] Pedagoga e atriz pela Universidade Federal do Pará. Pós-graduanda em Estudos Contemporâneos do Corpo pelo Instituto de Ciências da Arte da UFPA. Atriz integrante do Grupo de Teatro Universitário-GTU da UFPA e CIA AVUADOS de Teatro. Docente de Sentido religioso/ Ensino Religioso na Educação Infantil e Ensino Fundamental do Colégio Marista Nossa Senhora de Nazaré em Belém/ PA, 2011.

[3] Lev Semenovitch Vygotsky (Orsha, 17 de Novembro de 1896, — Moscou, 11 de Junho de 1934), foi um psicólogo bielo-russo, um pensador importante em sua área, pioneiro na noção de que o desenvolvimento intelectual das crianças ocorre em função das interações sociais e condições de vida. Veio a ser descoberto pelos meios acadêmicos ocidentais, muitos anos após a sua morte, que ocorreu em 1934, por tuberculose, aos 37 anos. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/LevVygotsky, acessado em 03/10/2011.

[4]Palavra que pode ser definida como elemento que representa ou expressa outros objetos, eventos, situações Cf. VYGOTSKY apud KOHL, 1993, p. 30).

Fonte da imagem: Arquivo pessoal do Pe. Giovanni Galo, sobre o Marajó.

Comentários

Postagens mais visitadas