Com Flores na janela... pro Fernando!







"Morrer, como viver, é algo completamente finito, apesar da dor que nos rasga a alma parecer eterna. Não importa o quanto cantemos, oremos ou iluminemos nosso mortos ou por quanto tempo o fazemos: como a vida, eles passarão, voltarão ao pó.
Chega um dia, calmo tempo, em que os cultuamos sem dor ardida ou pontiaguda do fatídico dia, apesar de ficar na gente a sensação saudosa dos dengos, cheiros e sabores das ocasiões felizes e descontraídas que tivemos ao lado deles. Ao depositarmos flores nos túmulos celebramos, algumas vezes, palavras que não julgamos necessário dizer, beijos que não trocamos a tempo de ouvir a respiração do corpo, juras que quebramos por dolo e faltas que cultivamos e das quais guardamos arrependimento velado.
Depositar flores sobre túmulos é um bom gesto, mas não melhor que oferecê-las diante do riso farto, dos mimos de quem as recebe como um dote inmensurável de ternura e zelo.
Creio que a dor de quem parte é um fio tênue desfeito num suspiro leve, derradeiro, retorno de nós ao mundo invisível que nos deu, pelo qual fomos , por um tempo UM com OUTROS.
A dor de quem fica tem outros nomes bem mais dolorosos: saudade, vazio, buraco, abismo, falta sem fim, espera irreversível, grito sem eco.
Com o Fernando (de quem não guardo o sobrenome) foi assim: doce e sal, luz e sombra, meiguice e mistério.
A viagem de ida resolveu fazer sozinho, no tempo, no lugar e da forma que resolveu partir, sem consulta prévia, longe da decisão alheia.
Penso e sofro, hoje, vendo essa dor que leva a gente da gente, mas é fato: se viver é um legado pessoal, ato incondicional e privilegiado de escolha, morrer também seja de foro íntimo; precisa ser entendido como extensão desse livre arbitrio que legitimamente nos cabe como dádiva divina e que não autorga a ninguém o direito ao julgamento de margem, periférico e focado unicamente em quem opta por uma vida curta, livre da solidão por meio de um fim trágico, ainda que isso soe pra nós algo inaceitável.
A VIDA que teve foi generosa com ele e conosco. Vivemos em sua companhia o que tivemos que viver, cada um e cada uma do exato modo com que usufruiu esta oportunidade: amigos, familiares, seus colegas de trabalho, admiradores, , vizinhos, transeuntes e curiosos.
Seu aroma suave como flor, perfumará outro jardim, deixando partículas de carinho no ar que respiramos e que nutre a nossa vida nessa momento sofrido. Deixa na casa onde dividiu cômodos, o alimento diário e retalhos de histórias pessoais uma lacuna, um lugar em branco: nos amigos um sentimento de vácuo, ânsia, estranhamento e ausência, que nada nem ninguém conseguirá preencher.
Em todos que o conheceram fica ELE mesmo meio que pela metade, pedindo que a gente preencha este espaço com o que pudermos pra tornar a nossa VIDA e a vida de quem amamos algo por que possamos lutar e acreditar.
Fernando foi-se como a lua breve reclamando um leito no horizonte, repouso dele mesmo ( as vezes a gente fica maior que as forças que dispomos e não nos damos conta disso; em outras nos damos conta, mas não estamos a vontade pra dividir esse peso com alguém! Isso também é escolha...).
Vai , pois o menino educado, generoso, bom e intranquilo entre as estrelas... fico aqui a olhar pro céu desejando encontrá-lo em cada brilho raro que desponta na noite da minha remota existência, quem sabe num almoço descontraído qualquer dia desses ou num novo passeio ao Mosqueiro, que tal?!rr (que boa lembrança guardo desses dias.. parece que foi ontem!..)
Siga em paz meu pequeno, meu singelo, doce e breve amigo...
Receba essas flores-palavras são pra ti.[...]"


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